terça-feira, 16 de junho de 2020

Se alguém chegar aqui pelo menos pode me entender um pouco

Não escrevo isso para ninguém exatamente, talvez para mim mesmo no futuro. Existe memórias, mas existem momentos de completo repúdio ao passado. Queria me lembrar mais de tudo o que era bonito e importante, mas é mais fácil perder tudo do que manter um arquivo realmente. As vezes encontro uma foto da minha avó quando ela ainda andava e quando ainda tinha consciência, mas hoje em dia está apenas sendo mantida viva porque mesmo que biologicamente não esteja pronta para morrer, de que adianta acordar poucos minutos e voltar a inanição do alzheimer? Quando falam do alzheimer é um pouco difícil de entender. Eu nunca entendi. Continuo sem entender. É muito difícil lidar com alguém que continua vivo, mas não existe mais. Vai se perdendo aos poucos. Uma hora para até de falar. É um processo tão gradual que você não percebe o tempo que perdeu. Um dia você se dá conta que não tem mais volta. É pior do que a morte, porque a morte é como se fosse o golpe final de uma série de mortes mais calmas. Ela tem 94 anos. Talvez 96... Não merecia morrer assim. Morreu agora em meio a pandemia. Dizem que morreu. Eu sou ateu, mas as vezes acho que talvez exista sim alguma força, algum Deus, a imagem é o que menos importa. Lembro de uma época que eu não tinha para onde ir, e uma das minhas namoradas quis se casar comigo, porque me amava, eu era a saída para todos os problemas dela, mas era tão assustador não ter controle nenhum para aquela situação. Eu gostava dela, do flerte inicial, de estar conhecendo alguém que eu poderia conversar, era até um alívio, mas eu não queria casar. Nem manter uma relação com mulher alguma. Não naquele momento. Pra piorar eu tinha certeza que ela estava possuída pelo capeta. Tive certeza. Não que ela não fosse uma pessoa legal ou interessante, mas acho que algo ali me fez alucinar ou escutar vozes. Lembro que rezei perguntando para mim mesmo ou para Deus, para a força invisível, se aquele era mesmo o caminho que eu deveria trilhar naquele momento, e intimamente eu sabia que não, porque não a amava eternamente, gostava sim, mas não era amor, não queria me casar, não queria a responsabilidade de uma relação séria jogada no meu colo, não queria depender de mulher nenhuma, mais uma vez, outra vez, mais uma de muitas vezes, mas a prova foi quando eu tive dúvidas de minha sanidade e escutei ela falar como o demônio, era uma outra voz, me respondia perguntas, debochava do que eu sabia até o momento. Foi o momento que eu decidi partir. Também não queria ser boneco sexual de ninguém. Fui embora, com o outro, o ex dela. Foi a mesma coisa ou pior. Foi pior. Hoje eu não acho que eu gostasse dele. Achei em algum momento, mas a sério não. O que faz de mim uma pessoa muito ruim, porque eu desprezava ele, no fundo achava um bosta. O que faz de mim um hipócrita. Eu não sei se ele chegou a gostar de mim, acho que era uma coisa de posse, ele me trazia para perto, mas na época eu estava sim envolvido com outras pessoas e posso ter sido sim uma pessoa muito ruim, do tipo de parecer gostar, mas sair com outro cara bem mais bonito ou ficar com alguma amiga e ignorar ele por semanas, e isso me faz hipocrita também, porque eu nao gosto de estar com mulheres, as vezes sinto falta de algumas e por outro lado prefiro homens, mas desprezo intimamente a todos, a unica vez que me apaixonei e quis me casar realmente com um homem, o mesmo fugiu de mim, assim como eu fugi daquela mulher que fez uma casinha pra mim e que por algum motivo eu sei que estava sim possuída pelo próprio deus do submundo, sobre o rapaz que eu fugi para escapar dele, não acho que o mesmo gostasse de mim, ele também nunca se importou, acho que eu poderia ter me poupado do tempo que perdi com ele. Não me acrescentou muitas coisas, por outro lado piorou minha auto-imagem, pela hipocrisia que foi ter que aguenta-lo. Aceitação é parte do processo, espero me construir melhor das próximas vezes. Voltando, sobre Deus, eu sou ateu, mas acho sim que talvez exista alguma coisa, as vezes acredito que existe algo, é difícil acreditar depois do nazismo, é difícil acreditar com nossas fábricas, com o nosso gosto por sangue animal, mas as vezes acontecem essas provas de que existe algo mais, por outro lado ver que uma pessoa que era boa, tranquila, calma, uma pessoa que já tinha sofrido tanto na vida acabar com alzheimer é um pouco cruel demais, ainda mais no meio de uma pandemia. 96 anos. Eu choro se eu vejo fotos com ela quando ela ainda andava e era consciente. Ela gostava de mim. Agora nem posso visita-la, por causa da doença mundial, desse vírus maldito. Para os médicos é hora de partir, mas por mim que ela se recuperasse mesmo, como um milagre, voltasse a andar, se lembrava de quem ela é, respondesse perguntas. Falam que acontecem milhares de milagres todos os dias, que os milagres são pequenos detalhes que não percebemos e com certeza, mas o milagre de ter conhecido aquela pessoa maravilhosa no passado não se compara a tragédia que é ver esse final e só lembrar de certos momentos ao encontrar uma foto perdida ao acaso. As lembranças morrem mais rápido do que as coisas. Eu pessoalmente não quero que a lembrança seja a última vez que a vi, antes disso tudo. Todos os anos antes de viajar eu sabia que talvez fosse a última vez que a encontraria em vida, mas não esperava uma situação em que ela ainda está viva, mas não posso visita-la, não posso encontrar com ela, e talvez dessa vez seja mesmo o final. Espero sim por Deus, existe essa esperança cega lá no fundo de que as coisas poderiam voltar a ser o que eram antes, mas sinceramente nem a casa se parece mais com a casa que existia na minha infância. A tsuki, a cachorrinha morreu de idade por esses tempos, praticamente durante o internamento da minha avó...  As coincidências precisam também serem cruéis? Eu não entendo porque essas mudanças exigem tantos sacrifícios. A minha última viagem me trouxe muitos ganhos emocionais, amadurecimento, por outro lado me custaram um ano perdido que poderia ter aproveitado ao lado da minha avó, mas em quais condições seria esse tempo? Melhor viver um ano longe, ignorando tudo, do que acompanhar uma pessoa definhar aos poucos. Isso é o Alzheimer. É bem cruel. Ela merecia lucidez e morrer um dia dormindo, não inconsciente com breves períodos de lucidez e lucidez essa que não existe mais controle sobre o próprio corpo. A psoríase, uma doença de pele que eu tenho, pele e articulação, ela aparece ou piora as vezes, é um pouco isso. Um dia meu dedo começou a doer muito, independente do remédio que eu tomasse. Hoje tenho dedos tortos. A articulação inflama, depois calcifica e pronto, alterou o formato das mãos, dos pés. É horrível. Acontece do nada, não existe controle algum. Hoje não sinto mais dor alguma nas articulações, mas toda vez que sinto alguma dor tenho medo de entortar ainda mais e acabar com as juntas travadas como daqueles idosos: eu ainda não sou idoso, mas ainda assim sofro com uma situação que não tenho controle algum. E é muito cruel não ter controle algum. Confiar cegamente. Um dedo da mão e dois dedos dos pés tiveram essa psoríase articular. Ficaram levemente tortos depois de semanas de dor intensa e inflamação interna. Não chega a ser como daqueles idosos que tiveram gota, mas é parecido. Muita gente não percebe esses detalhes, tem gente que acha que a vida é fácil para todos os outros, mas queria saber quantos aguentariam tudo o que passo ou já passei, por outro lado a vida é realmente um grande sofrimento para todos os que tem consciência e o progresso para a morte é o caminho de todos nós, por outro lado é assustador assistir o próprio corpo definhar, ano após ano.

quinta-feira, 11 de junho de 2020

A Lenda de Keret - Mito caanita / babilônico da antiga cidade perdida de Ugarit

O rei Keret, de Hubur (ou Khuburu), apesar de ter a reputação de ser filho do próprio grande Deus El, foi atingido por muitos infortúnios. Embora Keret tivesse sete esposas, todos elas morreram no parto ou de várias doenças ou o abandonaram, e Keret não teve filhos sobreviventes. Enquanto sua mãe teve oito filhos, Keret foi o único a sobreviver e ele não teve membros da família para sucedê-lo e viu sua dinastia em ruínas.
Keret rezou e lamentou sua situação. Enquanto dormia, o deus El apareceu a Keret, que lhe implorou por um herdeiro. El disse a Keret que ele deveria fazer guerra contra o reino de Udum e exigir que a filha do rei Pubala de Udum lhe fosse dada como esposa, recusando ofertas de prata e ouro como preço da paz.
Keret seguiu o conselho de El e partiu para Udum com um grande exército. Ao longo do caminho, ele parou em um santuário de Athirat / Asherah, a deusa do mar, e rezou para ela, prometendo dar-lhe uma grande homenagem em ouro e prata, se sua missão tivesse êxito.
Keret então sitiou Udum e, finalmente, prevaleceu e forçou o rei Pubala a dar sua filha (em algumas traduções, neta), Hariya, a Keret em casamento. Keret e Hariya foram casados ​​e ela lhe deu dois filhos e seis filhas. No entanto, Keret renegou sua promessa à deusa mãe do mar Athirat de lhe prestar um tributo de ouro e prata após seu casamento.
[Nesse ponto, há uma interrupção na história devido a danos nas tábuas-texto]. Quando a história recomeça, os filhos de Keret cresceram.

A deusa Athirat ficou brava com a promessa quebrada de Keret e o atingiu com uma doença mortal. A família de Keret chorou e orou por ele. Seu filho mais novo, Elhu, reclamou que um homem, que se dizia ser filho do grande deus El, não deveria morrer. Keret pediu apenas que sua filha Tatmanat, cuja devoção era a mais forte, orasse aos deuses por ele. Enquanto Tatmanat orava e lamentava, a terra primeiro ficou seca e árida por muitos anos, mas acabou sendo regada por uma grande chuva.
Na época, os deuses estavam debatendo o destino de Keret. Ao saber da promessa quebrada de Keret para Athirat, El ficou do lado de Keret e disse que o voto de Keret era irracional e que Keret não deveria ter cumprido. El então perguntou se algum dos outros deuses poderia curar Keret, mas nenhum estava disposto a fazê-lo. Então El realizou alguma mágica divina e criou uma mulher alada, Shatiqtu, com o poder de curar Keret. Shatiqtu esfriou a febre de Keret e curou-o de sua doença. Em dois dias, Keret se recuperou e retomou seu trono.
Então Yassub, o filho mais velho de Keret, se aproximou de Keret e o acusou de ser preguiçoso e indigno do trono e exigiu que Keret abdicasse. Keret ficou zangado e lançou uma terrível maldição sobre Yassub, pedindo a Horonu, o mestre dos demônios, para esmagar o crânio de Yassub.
Nesse ponto, a história termina e o final do texto parece estar faltando. Embora o fim da lenda seja desconhecido, muitos estudiosos assumem que depois Keret perdeu todos os seus filhos, exceto uma filha, que se tornou sua única herdeira.

Épico de Aqhat (O conto de Aqhat) - Lenda caanita da cidade perdida de Ugarit

Danel é descrito como um "governante justo" (Davies) ou "provavelmente um rei" (Curtis), fornecendo justiça a viúvas e órfãos. Danel começa a história sem um filho, embora a falta de material desde o início da história não torne claro se Danel perdeu filhos ou se ele simplesmente ainda não teve um filho. Em seis dias sucessivos, Danel faz oferendas em um templo, solicitando um filho. No dia sétimo, o Deus Baal pede ao Deus supremo El que forneça a Danel um filho, com o qual El concorda.
As orações de Danel aos deuses são respondidas com o nascimento de Aqhat. O agradecido Danel realiza um banquete para o qual convidou o Kotharat, grupo divindades femininas associadas à gravidez comuns aos Caanitas.
Uma lacuna aparece no texto. Depois disso, Danel recebe uma reverência do deus Kothar-wa-Khasis, que é grato a Danel por lhe proporcionar hospitalidade. De acordo com Fontenrose, a Danel é dado um arco quando Aqhat ainda é um "bebê", enquanto Wright lê a história depois que Aqhat "cresceu".
Depois de uma parte faltante do texto, a história recomeça como Aqhat, descrito por Louden como "agora um jovem rapaz", está comemorando um banquete no qual várias entidades estão presentes.
Aqhat, que agora tem o arco, presente de infância de seu pai, é oferecida uma recompensa pela Deusa Anath se ele o der a ela. Anath oferece Aqhat primeiro ouro e prata, mas ele recusa. Ela então oferece a imortalidade, mas ele se recusa novamente. Ao fazer suas ofertas, ela usa uma linguagem que provavelmente implica uma oferta de natureza sexual também. A recusa dele é desrespeitosa: ele diz a ela para ir buscar um arco com Kothar-wa-Hasis e diz que uma mulher não tem que fazer negócios com essas armas. Ele insiste que a imortalidade é impossível: todos os humanos devem morrer. Anath, indignada, sai para falar com o Deus supremo El.
Anath reclama com El, de acordo com Wright "aparentemente recebendo sua permissão para punir Aqhat" pela forma desrespeitosa de usa recusa. A resposta inicial de El, se ele der uma, não é legível devido à natureza danificada do tablet, mas o tom de Anath passa de um inicial em respeito polido para terríveis ameaças violentas contra o próprio El. Relutantemente, chantageado, El concede a Anath licença para fazer o que ela deseja.
Anath então mata Aqhat. O personagem que mata pessoalmente Aqhat é Yatpan, descrito por Vrezen e Van der Woude como "um dos guerreiros de Anath", mas por Pitard simplesmente como "um de seus devotos". Yatpan, magicamente transformado em uma águia, ataca Aqhat e o mata.

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Aqhat morre, e Anath se desespera, expressando arrependimento por sua morte. Embora o texto neste momento seja fragmentário, isso indica que seu arco foi quebrado no incidente e Anath também expressa sua angústia pela perda do arco cobiçado, em termos ainda mais fortes. Ela também lamenta que, devido ao assassinato, as colheitas em breve começarão a falhar.
Enquanto isso, Danel, que não percebe que seu filho está morto, continua cumprindo seus deveres judiciais no centro da cidade. Sua filha Paghat percebe que uma seca começou e que aves de rapina estão circulando em sua casa. Ela sente uma profunda tristeza.
Nesse ponto, o texto contém uma linguagem sobre as roupas de Danel sendo rasgadas, indicando que Paghat rasgou as roupas de Danel ou que Danel rasgou suas próprias roupas de luto pela seca. O texto faz Danel rezar pela chuva, seguido por várias linhas sobre uma seca que durou sete anos (o que é difícil de interpretar porque as tábuas estão danificadas). Danel vai para os campos, expressando seus desejos de que as lavouras cresçam e expressando esperança de que seu filho Aqhat retorne e faça a grande colheita, indicando que ele ainda não percebe que Aqhat morreu.
Nesse ponto, dois jovens aparecem e informam a Danel e Paghat que Aqhat foi morto pela Deusa Anath. Vendo abutres no alto, Danel chama Baal, pedindo a Baal que derrube os abutres, para que ele possa abri-los e procurar os restos mortais de seu filho. Baal obedece, mas Danel não encontra partes do corpo de seu filho. Danel vê o pai dos abutres, e Baal novamente leva o pai dos abutres para inspeção. Novamente, não há restos encontrados. Finalmente, Danel pede a Baal que derrube a mãe dos abutres, na qual ele encontra ossos e gordura de Aqhat. Danel enterra os restos que encontrou ao longo das margens do mar da Galiléia.

A morte injusta de Aqhat faz com que ocorra uma seca de anos. A irmã de Aqhat, Paghat, decide se vingar matando o guerreiro Yatpan.

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terça-feira, 9 de junho de 2020

A república - 06/06/2020

Não tinha mais para onde ir e precisava alugar logo um espaço em algum pensionato qualquer. Como tinha pouco dinheiro não tive muitas opções de escolha e acabei procurando um lugar que concentrasse um custo menor com um maior número de benefícios. Achei um anúncio e fui dar uma olhada. A casa era interessante, se tratava de uma casa grande, com vários quartos, espaço de convívio central e uma segunda casa ou casa dos fundos, separada por dois longos corredores laterais, era como se fosse um oito (8), ou um H, levei alguns itens pessoais, algumas malas, um pouco desgastante o trajeto, as malas todas pesadas, fui direto para o pequeno quarto dos fundos, que não tinha uma chave. Quem me recebeu foi um rapaz que parecia bem legal a primeira vista, e haviam outros moradores que acabaria por conhecer ao longo do tempo ali. Era uma república aberta as diferenças e sem muitos julgamentos. Logo de início me identifiquei com o Bruno, ele era alto e até um pouco padronizado, porte atlético, boa aparência. Com o passar dos dias chegou um novo morador, e assim como eu, este novo morador preferia não socializar muito e eu não encontrava muito com ele, porque afinal meu quarto ficava na casa dos fundos, então os encontros eram esporádicos na sala de convivência central, mas muitas vezes eu permanecia no meu quarto de qualquer maneira. Esse novo morador a qual vou chamar de Marcos em poucos dias mudou de comportamento e começou a trazer alguns amigos para o convívio geral, tocava músicas, muita bebida, algumas festas. A maior parte das pessoas que frequentavam eram gays ou bissexuais, acho que apenas dois moradores da república eram heterossexuais e uma única mulher grávida morou também por um tempo nessa casa, mas coisa de três dias depois de minha mudança eles se mudaram. Com o passar dos dias Marcos fez mais uma das costumeiras festas e depois disso duas pessoas ficaram morando no quarto dele ou pelo menos não pareciam ir embora. Uma delas ele apresentou como o namorado dele e a outra era um amigo. O namorado dele era um pouco calado, mas muito atraente, tinha alguma fixação com os outros homens da casa e me chamava sempre pra um cigarro e conversar. Vou chama-lo de Johnny.  O amigo era mais afeminado, mas ainda assim um homem, com um penteado mais chamativo e toda aquela postura mais territorial, fixando sempre a atenção para si, falava alto, realmente agia como um pavão, apesar de se dizer mais próximo das mulheres ou tentar alguma amizade com as mulheres da casa ou amigas dos outros rapazes, o nome dele era Lu. Tudo isso aconteceu em menos de um mês, duas semanas, foi uma questão de dias. Havia um cachorro nos fundos, que era bem grande e pertencia ao pessoal que era responsável pelas contas dessa República. Esse cachorro era bem bonzinho, mas sempre parecia meio frio, também não me lembro muito bem da ração, mas era um pote que sempre estava vazio, as vezes eu colocava alguma coisa ou ele lambia algo no chão, mas não era um cachorro com calor. Alguns objetos da casa começaram a desaparecer, mas nada de importante, até que um dia cheguei no meu quarto e encontrei o namorado do Marcos dormindo lá mesmo, na minha cama. Fui falar com ele e ele disse que havia brigado com o Marcos e que agora o Marcos estava na Sala com uma faca, disse que eles tinham bebido muito e acabaram discutindo. Pedi que ele saísse, mas o Johnny pediu para ficar ali. Fui na sala central da casa da frente entender a situação, um pouco contrariado por ter sido envolvido em problemas desnecessários, mas chegando lá não encontrei o Marcos. Lu apareceu falando que eu tinha que ir embora e me deu um tapa muito forte. Começou a me ameaçar, dizer que ia chamar a polícia, que sabia o que eu tinha feito e eram acusações sem sentido, mas ele estava realmente muito irritado comigo. Tenho pra mim que ele era apaixonado pelo Johnny. Eu disse que eu não iria embora, porque já tinha pago o mês e só iria receber em alguns dias e ele nem mesmo era morador para dizer o que eu deveria fazer ou não. Nesse momento Marcos apareceu com a faca na mão e disse que não aguentava mais minha presença ali e que eu deveria ir embora, porque se eu não fosse embora ele faria uma besteira. Lu nesse momento pareceu uma pessoa sensata e tentou acalmar Marcos, mas algo ali não estava certo. Eu não sabia do que eles estavam falando e também não sabia o que estava acontecendo. Os outros moradores apareceram, inclusive o primeiro rapaz que me recebeu, de porte atlético. Ele tinha um sorriso irônico no rosto e parecia muito calmo com aquela situação absurda. Me chamou de lado e disse que era melhor eu ir embora naquele exato momento, antes que fosse tarde. Ele era do meu tamanho, até maior, e então colocou seu braço no meu pescoço e falou no meu ouvido que Marcos era psicótico e tinha acabado de surtar, estava completamente paranoico e que tinha algo contra mim. Isso não era problema meu, disse que não iria embora e resolvi voltar para o meu quarto, na esperança que isso tudo se resolvesse e todos se acalmassem. Chegando no meu quarto Johnny ainda estava lá. Agora de cueca. Falei pra ele que era melhor ele sair, que eu estava cansado e que Marcos estava realmente insano, que seria melhor evitar mais problemas. Johnny olhou pra mim, sem emoção alguma, fechou a porta e tentou me socar, disse que agora o quarto era dele e que eu já tinha "enchido o saco", tive que segurar ele, mas ele não parava e falava que ele ia me fazer aprender uma lição. Consegui segurar ele até ele se acalmar com um mata leão, mas ele era muito forte e me quebrou demais, eu disse que só ia solta-lo se ele saísse do meu quarto naquela mesma hora, fiz ele pedir pra soltar, mas se ele tivesse continuado com certeza me dominava porque eu já não tinha mais folego algum. Peguei a roupa dele, joguei pra ele se vestir e abri a porta. Ele saiu. Passado alguns instantes, escuto uma gritaria e depois passos se aproximando. Os três aparecem no meu quarto. Me ameaçaram e diziam que eu precisava ir embora antes que alguém fizesse uma besteira. Algo não estava certo ali e havia um cheiro muito forte de carniça. Pergunto do Bruno, o outro morador de porte atlético que parecia comigo. Eles parecem muito confusos e dizem que não sabem de quem eu estou falando. Lu tira a faca do bolso e dessa vez Marcos é quem tenta acalma-lo. Tinha algo em Lu que lembrava muito uma mulher. Ele me ameaça com a faca. Tem sangue na roupa de Lu. Marcos começa a rir e responde alguém, como se tivesse um ponto eletrônico no ouvido, como se falasse com um aparelho telefônico. Johnny entra de novo no meu quarto, segura meu rosto bem firme e fala bem devagar olhando fundo nos meus olhos: "Eu te amo. Vai embora. Você precisa ir embora". Lu solta uma risada e se corta na coxa. Marcos pega a faca e se corta no braço. Eu reparo que o Johnny também parecia frio. Acho melhor não discutir e faço uma das malas, nisso Lu fica cada vez mais descontrolado e bate na mesa do quarto. "Vai embora porra!". Johnny tira toda a roupa. Eu pego o celular, falo que vou chamar o uber e que estou indo embora sim. Já não me importava em ir embora, sem dinheiro, iria para qualquer lugar, até para um hotel, qualquer lugar mesmo. A bateria do meu celular estava 13% e descarregando. Há dias que está com um problema de bateria. Meu celular desliga. Johnny se aproxima de novo, agora completamente pelado, pega a minha mão e coloca em sua garganta, tem um corte ali, esse corte não existia. Eu enlouqueci? Tem sangue nas minhas roupas. Pego uma mochila, guardo algumas coisas pessoais e saio do meu quarto, olho para dentro para fechar a porta e vejo Johnny na minha cama ensanguentado, em cima dele está Lu, de calcinha, gritando com uma faca na mão, eu fecho a porta e me afasto, a porta não tem chave. O cachorro também não está muito certo, está caído, parece morto há vários dias, realmente apodrecido, ontem mesmo estava vivo. É por isso que fedia carniça. O cachorro fedia carniça. Vou andando rápido em direção à entrada, pelo longo corredor. Escuto a porta da casa dos fundos abrindo. Começo a correr. A porta da frente está trancada e minha chave da entrada ficou na mesa do quarto. Jogo a minha mala pelo muro e pulo o portão. Começo a correr. Continuo correndo. Todas as minhas coisas ficaram nessa casa. Minha roupa está limpa. Minha mão está limpa. Eu imaginei aquele sangue? Vou embora. Penso em falar com a polícia. Volto lá no dia seguinte sozinho. Não vou a polícia porque não vão acreditar em mim. Preciso pegar o resto de minhas malas. Quem atende é o Marcos. Diz que nunca me viu antes e fecha a porta. Até hoje não sei direito o que aconteceu naquela república, será que eu tive um surto psicótico?

quarta-feira, 22 de janeiro de 2020

Envelhecer e superar os traumas: Por que me furtaram tantas vezes?

Por muitos anos acreditei que todas as vezes que fui furtado por amigos ou conhecidos era por motivos de inveja, porque estavam me considerando um boy, um mimado, alguém que talvez tivesse grana se fazendo de pobre, mil razões, também me dava explicações condescendentes divagando sobre as condições de classe, as questões de desemprego, a condição das pessoas que me furtaram, sempre inventei mil razões para não entender logo o óbvio, que anos depois só me foi esclarecido hoje, nunca me furtaram porque me consideraram como alguém rico (já foi acusado), sempre souberam que eu também era um fodido como eles, mas me furtaram porque tinham raiva de mim, da minha indiferença, do fato de eu realmente poder sair daquele buraco se quisesse, já eles inteiramente tragados pela própria situação a que estavam amarrados, mas se eu estava lá, não estava também ligado àquele horror? Pois bem, furtos foram o que paguei por minha ignorância, por outro lado não é essa também outra daquelas velhas explicações e justificativas que me conto afim de me convencer do indefensável. Porque se eu estava indiferente, ignorante da condição a que estava cercado, eles também estavam muito cegos para a própria situação, porque nunca que foder alguém que já tá fodido vai trazer qualquer ganho pessoal, mesmo assim diferente deles eu ainda tinha algum bem material ou qualquer coisa assim, mas eles só enxergaram o ganho momentâneo, sem pensar no futuro, ou outras questões porque quando me roubaram um notebook de 6 anos, com memórias, arquivos irrecuperáveis, garantiram sim o almoço grátis por algumas semanas, talvez até pelo mês, mas e depois? Perderam um acordo muito melhor ao meu lado, uma vez que a casa era dividida com uma menina que recebia dinheiro dos pais, de um trabalhador (que tinha conseguido um estágio e já tinha um emprego em local respeitável, no caso estou falando de mim, eu mesmo), enfim, acharam melhor roubar a casa inteira para viver um mês quando poderiam prolongar meses de baixos alugueis e contas divididas, precisando apenas correr atrás de sua cota compartilhada, mas jamais vão pensar isso, por isso que vão continuar na pobreza que os cerca, mas eu escapei dessa mesma pobreza? Se escapei foi para passar ainda pior, porque acabei em um relacionamento de negócios com pessoas que me traíram assim que possível, não que o furto já não fosse a própria traição, mas houveram ainda traições piores, como no caso da ingrata e inútil que trouxe para morar comigo, paguei até aluguel adiantado pra conseguir um espaço, mantive as contas em dia por quase dois meses, para não ter nem mesmo um apoio, uma ajuda de custo qualquer, o que tive em troca foi desespero, reclamações, exigência por dinheiro, fui até chantageado em determinado momento, o que pra mim foi a gota d'água final daquele "romance". A desgraçada foi embora, levou quase tudo o que havia na casa, porque "tinha sido ela que tinha conseguido", nunca me ajudou nem mesmo com um real e ainda espalhou pelos meus espaços de vivencia que eu estava devendo dinheiro pra ela!!!! Foi horrível. Daí tem aquela história que pessoas manipuladoras se colocam sempre como vítima, não é basicamente o que estou fazendo agora? O que tenho ao meu favor é que claramente, em qualquer tribunal, não que eu confie nas leis da legislação brasileira, confio muito menos "nas leis dos homens", mas tudo o que for justo, universal, atemporal, se existe uma lei de bem comum, em todas essas leis possíveis eu com certeza sofri muito e novamente POR MINHA PRÓPRIA CAUSA, porque deveria ter ficado mais atento, deveria ter me precavido melhor, mas enfim, que atire a primeira pedra quem nunca sofreu um golpe cabuloso e PAGOU PRA VER o que seria aquilo. Muitos me alertaram, mas existe algo de irremediavelmente sedutor nessas pessoas que parecem marcadas pelo destino com o único fim de te apunhalar pelas costas e gritando que te odeiam do fundo de suas almas, isso se tiverem alguma, o que duvido. As pessoas que furtam te mostram que furtaram uma coisa ou outra ao longo do caminho, mas você meio que ignora porque "não foi lá grande coisa", mas foi sim, sempre é grande coisa quando um pobre furta outro pobre e finge que nada aconteceu, seja uma planta, seja uma roupa, qualquer coisa. Eu mesmo olhando fotos antigas percebo que perdi muitas roupas e até objetos que não caberiam em nenhum bolso, mesmo assim para onde foi tudo isso que perdi? Será que virou pedra de crack? Será que virou fralda pra algum bebê que deveria ser recolhido pelo Estado? Porque se os pais não tem condição e vão garantir uma vida de miséria para as crianças é até melhor que o Estado as recolha, ou não? Então sim, uma coisa é compreender porque alguém furta alguém, mas outra coisa é justificar tudo isso. É injustificável. Mas não foi à toa, foi diretamente contra mim, foi uma forma de me atingir, de me jogar de volta aos porcos, de me retirar à força daquele lugar de invulnerabilidade pretensiosa que me coloco sempre que me sinto inseguro, como se pudesse ter o direito de não me envolver em problemas que não teria condições de resolver. "Por que a distância? Se acha melhor do que nós?" "Por que não quer ser colocado em meio a um problema que você não iniciou, que não faz parte da sua vida, que você não tem resposta? Não quer ajudar?" Se não ajudar vamos tomar de você. Não é isso também uma forma de extorsão? Me obrigar a contribuir e me deixar em falta? Por outro lado não é também um furto ter que pagar um aluguel para viver em algum lugar? Ter que pagar para poder comer em uma sociedade que produz mais alimento do que podemos consumir e muito é desperdiçado diariamente não é também outra forma de extorquir alguém? Não é um furto ter o dinheiro que deveria ser para investimento público desviado para o enriquecimento de algum capitalista local? Não somos extorquidos todos os meses pelas taxas e tributos inseridos nas contas de luz e de água? Por outro lado realmente nunca precisei furtar ninguém pra conseguir as coisas que "eu" quero, acusando o "outro" de "egoísta" porque não "me" deu o que "eu" queria... Estranha lógica essa de quem sempre se vê sem nada. O furto do Estado contra mim é um furto que ao menos me garante uma contrapartida mínima, a saber o serviço da luz, o serviço da água, o aluguel está em um contrato mais na esfera do privado, não tanto estatal, mas ainda assim me garante o serviço de ter uma moradia. Agora o furto dos pobres contra os pobres ajuda alguém a sair de onde está? E se estiver saindo da miséria é melhor que saia rápido, porque vão tentar te impedir a todo custo. Pagar as minhas contas, não querer foder ninguém, não furtar, ser um bom cristão (essa é uma piada), Isso tudo faz de mim alguém melhor? Ter tido educação financeira (mesmo que autodidata) não é um sinal dessa diferença? Diferença que é o motivo de tanto ódio e consequentes represálias. Porém ignorância não é desculpa para mal caratismo ou justificativa para foder quem tá no mesmo patamar que o seu, já é difícil com a economia do Brasil, ainda tem que ficar expulsando os ratos antes que comam o próprio barco afundando logo à todos? Ainda por cima colocam a culpa na vítima!!!!! Quem atacou primeiro? Talvez não querer se envolver por não ter condições para resolver um problema que não é seu seja a primeira grande ofensa e motivação para uma vingança. "Como você ousa não querer resolver o meu problema por mim? Agora vai sofrer as consequências!" Daí ainda passa como se fosse você que não estivesse cooperando... Todos erram, todos mudam com o tempo, quantas vezes não me arrependi de erros cometidos, acho que todos merecem uma segunda, terceira chance, porém golpista não se lida pelo âmbito moral, mas é a forma de negócio a que eles se vêem acostumados, se encontram irremediavelmente inseridos, então não tem conversa com golpista, não tem arrependimento, em algum momento vão querer te passar a perna pra ganhar em cima, porque é o único jeito que eles concebem a realidade dos negócios, por isso que acabam na miséria, o que deve ser um aviso para toda pessoa de bem, a miséria está uma porta de distância, então cuidado, porque um dia você tem dinheiro, no outro pode até perder a vida (vida é um valor inestimável em um mundo com tempo finito e sem um além-terra "paraíso espacial"), tudo por ganância alheia.

Da pureza das intenções à crueldade humana

Às vezes sinto como se a tecnologia estivesse contra mim, me impedindo o acesso na velocidade adequada quando é necessário, existem aqueles momentos que a inspiração faz uma de suas visitas, mas pode durar tão pouco e momentos depois já se foi, bem como até mesmo sua lembrança. Quantas rimas, sons, ideias, lembranças nós já não nos esquecemos tão subitamente quanto nos recordamos. É um pouco de pretensão escrever tanto sobre coisas tão simples, bem como sobre natureza humana que é tão evidente porque nos rodeia, nos outros, em nós mesmos. Há pessoas sinceras, muito boas, que agem por bondade, enquanto outras são hipócritas, mentirosas, até mesmo em suas próprias verdades. Às vezes me coloco ao lado dos hipócritas, mas em geral acho que me coloco ao lado dos palhaços e das tragédias. Me sinto sempre péssimo, sempre me tenho repreensões, não me sinto seguro o suficiente para errar, é quase sempre como se o erro fosse a maior prova daquilo que jamais desejei ser, alguém insuficiente, imbecil, estúpido em vários sentidos, ignorante até mesmo dos costumes... Uma vez que você conhece alguém legal, em que se é possível confiar, por momentos você pode se abster de toda a comédia humana envolvendo farsantes, golpistas, mentirosos, gente que quer te prejudicar por alguma razão pessoal... É a lógica do medo e da competição. Tem vezes que me esqueço sobre quem sou, me esqueço até mesmo de quem sou, não sobre o que sou, mas sobre o que faz de mim ser eu mesmo, aquilo de mais essencial, as vezes até me esqueço e me vejo competindo, não por diversão, não por escolha, por esporte, mas quando acordo me enxergo como que tragado para todo esse ambiente de competição, acordos, traições, intrigas. Quando percebo eu fujo assim que possível, mas não tinha sido até então peça do mesmo mecanismo? Se estava lá, centrifugado por uma força que foge à todos nós, não era também parte do mesmo sistema de relações, trocas, significados? É nisso que me choco. Porque como eu disse no começo, às vezes me sinto quase que hipócrita, me envergonho, mas o que me sinto mesmo é como um palhaço dos mais rídiculos, com movimentos exagerados, suspiros altos. Mesmo assim tenho meus limites e fronteiras demarcadas, tem morais e imoralismos que não me sinto representado, talvez porque na maioria das vezes fui sim prejudicado, mas eu falo como se a minha indiferença, um lugar que funciona como aquele pedestal das pessoas inseguras, aquele lugar distante que me coloco como se fosse qualquer outra pessoa invulnerável, inviolável, para segundos depois ser derrubado e como que lançado na mais vergonhosa das lamas e consideradas grandes gafes sociais... como se minha indiferença não fosse por si só ferramenta, arma, instrumento da mais terrível das hipocrisias, da mais terrível forma de olhar nos olhos de alguém e repetir a palavra de ordem: "se vira". Porém é difícil quando você está em um barco, fazendo acordos, onde todos podem ganhar, mas muitos a sua volta não ganham nada e ainda te odeiam pelo seu progresso. Sinceramente, que progresso? É isso que choca também, o fato de ser verdade consentida meio que por todos de que a grama é sempre mais fresca no vizinho, o fato de nós nunca estarmos satisfeitos com nada, e não sei direito como deve ser para os ocidentais em geral, porque muitos não tiveram nem o mais breve contato com o budismo ou qualquer forma mais elevada de lidar com os problemas mundanos, onde dinheiro talvez não seja o mais nobre dos ideais, mas é esse um dos pontos reais, talvez sejam pessoas que so tiveram contato com religiões como aquela do cristianismo evangélico da prosperidade material como "promessa" de Deus, garantido custe o que custar... Isso tudo sem educação financeira, então fica díficil, porque significa uma realidade triste, mais do que miserável, onde não existe nem aquela pobreza honesta e idealizada de balzac ou dickens [?], muita gente ávida por dinheiro aplicando golpes tortos em gente fodida, coisas tão absurdas (para o seu sentido mais torpe e ruim) que talvez nem doistoievsky poderia antecipar. Aí fica nisso, realidade low budget tendo que lidar com as imposições que o meio te exige. Talvez farei um meme para discutir sobre a natureza humana, no seu melhor até o seu pior, sem parecer um texto sério, porque esses textos talvez alguém chegue a ler, mas em geral leio sozinho, como diário de coisas que vou me esquecer, por exemplo, percebi agora que não havia escrito nada aqui ao longo de 2019. Por que?

sábado, 18 de janeiro de 2020

Microviolências e outras frustrações cotidianas

Já nem sei direito o que escrevi nos últimos posts, mas com certeza alguns vão me deixar envergonhado. Todos os anos pareço ser outra pessoa e já não me identifico com nada do que escrevi antes, talvez com a raiz dos problemas, mas a forma de lidar ou entender os mesmos mudou em vários sentidos. Passei o dia inteiro pensando sobre o passado, com ansiedade, tive pesadelos, dias me correndo, sofrendo com meus erros, mesmo que não declarados, com o que deveria fazer e não fiz... Pensei inicialmente em escrever dois posts diferentes, mas penso que é melhor deixar tudo em algo mais conciso. Pensei muito em microviolências e liberdade. Tenho pais maravilhosos, sim, esse é um post sobre família e relacionamentos. Eles são pessoas muito boas comigo, meu pai é um homem simples, minha mãe teve educação, mas ainda assim tem diversas concepções "boomer" sobre maconha ou mesmo comunismo, apesar de ser mais liberal em relação aos lgbtqi, existem sim alguns preconceitos encobertos, talvez mais relacionados à classe, já meu pai é um pouco mais ignorante e diversas vezes o vejo cometer falas com teor racista ou homofóbico. Quando era mais novo também já cometi diversos erros de julgamento, menosprezando outras pessoas ou me menosprezando por coisas banais como aparência ou sexualidade. Na minha adolescência ouvir comentários homofóbicos na minha própria casa foi algo de grande estresse e muitas vezes me ofendeu intimamente ou me causou algum tipo de insegurança que carrego comigo até hoje, porém agora, quem eu sou, tenho muito mais noção de que essas falas são uma forma dele se sentir melhor, "mais ajustado", como mecanismo para lidar com suas próprias paranóias e frustrações. Meu pai sempre teve vergonha de ser pobre, de seu passado na pobreza, como todo heterossexual bonito, casou com uma mulher com vida financeira mais equilibrada, tanto no primeiro casamento quanto no segundo. Pouco tempo surge o milagre da vida e a gravidez. A família inteira da minha mãe foi contra e todos sempre comentaram que ele deveria trabalhar como qualquer coisa, para pelo menos ter uma carteira assinada. Meu pai sempre se recusou aos conselhos da família da minha mãe, talvez pela vontade de se afirmar, hoje está velho, doente, sem aposentadoria e ainda vive muitas vezes com o favor da família e de minha mãe. Minha mãe, coitada, recusou diversos casamentos arranjados que seriam muito melhores para ela, enquanto segurança e patrimônio, talvez também como uma forma de rebeldia contra os interesses da família, legislando sobre nós como se fossemos crianças. Voltando ao meu pai, até hoje ele tem uma loja de antiguidades, que é na verdade um dos lugares mais legais que conheço desde a infância, mas nunca foi uma loja lucrativa. Serve como forma de dizer que ele não é um simples empregado, mas dono de um estabelecimento comercial. É claro que isso marcou sua personalidade de uma hipocrisia que as vezes é indefensável para nós, seus filhos. Minha irmã mais velha até rompeu relações com ele. Por outro lado ele como todos nós é uma pessoa que cometeu erros e tem também seus arrependimentos, mesmo comentando diversas coisas homofóbicas, não sei se ele me considera heterossexual, o que acredito que não porque tive adolescência, tive namorados, e ele não é cego, além de mais velho, porém por ser um homem simples as vezes desconfio de sua percepção sobre a vida e mesmo sobre valores, uma vez que o mesmo sempre viveu às custas da minha mãe, não que ele não contribuisse, quando ele consegue um dinheiro ele gasta todo em casa, mas no sentido de que nunca foi suficiente para garantir um aluguel. Por outro lado minha casa sempre teve móveis verdadeiros, nada daquelas produções em massa com madeira prensada, todo mundo sabe o quanto é caro decorar uma casa e o quanto é caro ter uma boa cama, o que é o meu caso, tenho uma ótima cama e foi meu pai que arranjou, sem nunca me cobrar qualquer coisa. Este é o ponto, na adolescência todas essas questões interligadas mais os comentários de homofobia me incomodavam muito e me prejudicaram muito em meu desenvolvimento, até hoje tenho dificuldades para confiar em outras pessoas, tenho medo de me abrir, considero todos traidores, por outro lado hoje tenho mais referencial teórico para entender, compreender e modificar o que sinto em relação ao que os outros dizem ou fazem. Aqui na casa dos meus pais não tenho a mesma liberdade para fumar um baseado em paz, sempre existe aquela ideia "boomer" da guerra as drogas e da marginalização. Claro que tem gente que até apanha da familia se for pego fumando um baseado, tenho sorte de vir de uma família mais educada, porém é sempre aquela invasão de privacidade, não posso acender um cigarro que já batem na minha porta, reclamam do cheiro, "preciso guardar algo no seu quarto", e por aí vai, recebo mensagens no celular sobre "poder me abrir caso esteja passando por algum problema", ou "não precisa esconder nada, só queremos o seu melhor", falas que podem parecer engraçadas para alguns e bem intencionadas para outros, mas também são formas sutis de me ofender, porque me colocam como alguém que está cometendo uma ilegalidade terrível, quando só queria mesmo ficar no pc em paz, e chapado, por que não? Enfim, dias seguidos sem poder fumar tranquilamente, sempre paranóico porque em questão de minutos batem em minha porta (que preciso deixar trancada, porque se estiver destrancada vão entrar simplesmente, sem bater), por essas e outras acabo sofrendo e me sentindo muito mal, porque não quero dar nenhuma preocupação, ao mesmo tempo não tennho a mesma liberdade a que estou acostumado. Eu entendo que não estou na minha casa, não fumo na sala, vendo tv, não fumo enquanto estou cozinhando, não posso fumar na área de serviço porque "ilegal", enfim, as proibições estão postas e tem também os outros vizinhos, porque moro em prédio. As vezes sou obrigado a correr risco de sofrer algo contra minha integridade física porque preciso sair na rua para poder fumar um baseado em paz, em um pais que pode me prender por acender mato "alucinógeno", por essas e outras que acabo sofrendo demais com as outras pessoas e costumo me isolar, porque é mais seguro. Não que morar aqui com meus pais seja inseguro, mas emocionalmente, psicológicamente, mesmo que não seja uma referência a mim, ao meu individuo, é horrível ouvir comentários racistas ou homofóbicos do meu próprio pai, saber que o mesmo nunca estudou, trabalhou poucos anos formalmente e depois insistiu nisso de ser empreendedor em uma época que não tinha nem sentido (as pessoas ainda acreditavam em fundos de pensões), enfim, ele tinha toda a chance do mundo, na ditadura qualquer idiota tinha emprego formal ou era concursado, basta ver o numero de "boomers" concursados que não sabem nem mexer no celular e estão lá com seus bons salários enquanto nós jovens na miséria... É nesse sentido minha frustração também, saber de onde vim, saber o que poderia ter sido melhor na minha vida, que diferença faria se eu tivesse tido um pai estudado que tivesse ao menos um carro velho pra me passar (assim eu poderia fazer um dinheiro e deixaria rendendo em algum investimento), mas nem isso, tenho que começar do zero porque o cara que era para ser meu "idolo" ou "figura exemplar" é um cara que se recusou a trabalhar de qualquer coisa por  "orgulho"! Se não fosse esse "orgulho", se tivesse escutado qualquer comentário idiota dos meus tios mais ricos como "por que não trabalhou no supermercado?", hoje com certeza o velho estaria aposentado. Por outro lado isso é culpa da minha mãe, que nunca colocou um ponto final, uma vez que ela pode ir levando a situação com a barriga. Também não dá pra demonizar o meu pai uma vez que origem simples, baixa escolaridade, inserido artificialmente em uma família mais organizada, enfim, agora racista e homofóbico é só um complemento da classe de onde ele veio e nunca saiu de verdade, porque se saiu foi pra depender dos outros e sofrer humilhação. Como todos nós sabemos depender dos outros é um dos piores venenos que alguém pode viver submetido, eu mesmo hoje sou grato dele não ter colocado um fim em si mesmo ou nos outros, por que foi sim humilhado diversas vezes por causa de dinheiro ou falta de dinheiro, o que talvez seja um motivo pra ele insistir nessa ideia de negócio próprio... É aquilo, ilusões, ilusões, muitos me colocam como rico, não sabem o que passei aqui e o que continuo passando. Sei que tem muitas pessoas com problemas piores, que apanham em casa porque "foram flagrados" com maconha, por serem gays, sei lá, qualquer coisa rídicula assim, porém sofrimentos não são comparáveis, não existe um troféu para quem sofreu mais ou menos, independente se as pessoas não acham isso grande coisa, pra mim é sempre de grande transtorno mental/psíquico ser colocado nessa situação de "flagrante" como se estivesse com "algum problema", sem minha privacidade respeitada, ouvindo comentários ruins sobre algo que eu sou (lgbtqi), ouvindo comentários ruins sobre a raça de outras pessoas, como se isso fizesse dele melhor, porque heterossexual e "bem casado", temente a Deus, cuja "Riqueza são os filhos", me poupem disso tudo. São esses os pontos que me colocam as vezes em desespero. Seria muito mais fácil ficar aqui, sem precisar pagar aluguel, sem precisar trabalhar desgraçadamente para ter minha vida própria, mas depender dos meus pais só me faz pensar que sou o meu próprio pai e nesse sentido jamais quero viver a vida que ele levou, tenho horror a quem humilha o próximo por dinheiro, eu mesmo sendo pobre, trabalhador, as vezes penso em ficar por aqui, mas só de pensar nisso tudo, de que não posso acender um baseado em paz, porque vão entrar no meu quarto, talvez vasculhar minhas coisas quando estiver ausente, atitudes que só contribuiram para me deixar paranóico, enfim, com problemas de confiança no próximo, fora isso, o fato das piadas com homossexuais, quer dizer, se um dia eu quiser namorar um homem ele vai "ficar angustiado" ou "discordar", como se tivesse esse direito! Eu não penso em namorar um homem, já tentei algumas vezes e foi horrível, talvez por assistir o casamento tradicional maravilhoso dos meus pais, tenho trauma quando fui colocado em situação de casal com mulheres também, enfim, é péssimo não ser respeitado em minha sensibilidade, sendo obrigado a ouvir comentários de ignorância que não escuto em lugar algum, não ter dinheiro pra começar, não ter apoio do meu pai porque ele depende em partes do apoio da minha própria mãe, ter que correr atrás de tudo pra não viver na dependência e ser humilhado por causa disso, ter que ficar sozinho por não confiar em ninguém porque ninguém é de confiança, ouvir comentários homofóbicos e racistas contrariando tudo o que sou ou que acredito, não poder fumar maconha em paz, sem sofrer constrangimento, porque na lógica invertida claramente "existe um problema", o único ponto positivo é que eles não me internariam à força em campo de reabilitação algum, assim como fizeram no filme nacional "O Bicho de Sete Cabeças", porém só de ter que fumar escondido já me sinto péssimo, como se estivesse fazendo algo de errado, quando na real seria mais tranquilo viver se eles tentassem ao menos não me criminalizar ou "descobrir o meu terrível segredo", até aqueles vídeos absurdos com mentiras sobre o uso de maconha e toda aquela panfletagem careta de merda da época da ditadura que os "boomers" mandam pelo whatsapp são uma ofensa, também queria ser poupado... Tenho me cobrado um pouco pra sair de casa, dessa vez sai algumas vezes em SP, encontrei um amigo antigo muito querido, encontrei outro amigo que também gosto muito, marquei com uma amiga, mas é muito díficil pra mim querer fazer qualquer coisa que envolva ficar no frio, na chuva, pegar transporte público, socializar... Gosto muito de ficar em casa, com um cafézinho, lendo alguma coisa, por outro lado por ter que fumar maconha escondido, para não gerar comoção ou desconfianças ou mesmo preocupação desnecessária, ou comentários hipócritas de perguntas retóricas como "que cheiro é esse heim?", acabo ficando com o horário um pouco desregulado, ficando por vezes acordado de madrugada, logo perdi muitos dias que poderiam fazer algo à tarde, mesmo lidar com meus sobrinhos que são crianças lindas, diversos dias praticamente "ignorei" as crianças e isso me fez me sentir um pouco culpado, muito egoísta, poderia ter passado ao menos 15 minutos com as crianças, mas eu queria sair da cama? Me culpo também de não ter ido na minha avó doente todos os dias, mesmo assim acordo quase as 16 horas da tarde, nas férias, porque resolvi ficar online no dia anterior, não fazendo nada... Perco mais horas no facebook do que com pessoas que estão a minha volta. Porém as vezes prefiro mesmo ficar online e em casa, sem sair, fumando um baseado enquanto assisto algo no youtube, queria só conseguir acordar mais cedo para pelo menos ir almoçar com minha avó, mesmo assim me acarreta um certo sofrimento saber que ela está cada vez "morta", da mesma forma tenho sofrido psiquicamente por não dar a devida atenção às crianças, o que me deprime ainda mais, me dando ainda maior vontade de ficar sem interação alguma com ninguém, o que me acarreta ainda mais sofrimento por simplesmente não querer interagir com ninguém e me culpo por esse egoísmo.

sexta-feira, 10 de janeiro de 2020

Nothing to say, nothing to do, no news.

Faz um tempo que não paro e penso um pouco sobre tudo, por esse meio, a escrita. É possível passar dias falando consigo mesmo, no inconsciente, as vezes até quebrando o silêncio e literalmente começo a conversar comigo, repasso tudo o que errei ou o que devo fazer, meus planos, inseguranças, receios. Lembro que em 2019, logo no começo do ano, sofri um acidente e fiquei 3 meses recuperando de uma fratura na clavícula. Cai de bicicleta em uma rua perto de casa porque não vi uma construção deixada sem avisos, mas o aviso deveria ser eu mesmo, uma vez que tinha reparado na construção quando ainda era dia, porém sou realmente distraído, preocupado comigo mesmo e com todas as rotinas diferentes que preciso cumprir, chapado ainda, realmente me esqueci completamente daquela construção, por isso errei, pela falta de atenção com minha própria integridade, minha bicicleta sem lanterna, plaft, coisa de minutos ou segundos estava no chão, sangrando, sem mexer um braço. Tive a sorte de me recuperar integralmente, perdi 3 meses de dinheiro que não fiz, ganhei uma calcificação torta sobre a fratura, alguns pontos na cabeça e é claro promessas de gente que nunca me ajudou, mas deveriam me ajudar? Nunca foi nenhuma obrigação, mas não me prometa que vai me levar algo pra me ajudar e daí não leve e faça silêncio, era melhor que não houvessem prometido nada em primeiro lugar. Quem sou eu pra julgar os outros, se sou eu que fujo e abandono a todos? Mas ficar em um lugar tem seus custos, nunca foi realmente uma fuga, mas uma busca por outras formas de continuar existindo, então não podia permanecer e tive que ir para outro lugar, mas já quero ir para outro lugar novamente, não como cigano, mas como jovem que pretende-se livre. Liberdade para viver pobre precisando de favores? Fui enganado, fui roubado, fui usado, mas a culpa foi minha, porque com a idade que eu tenho deveria saber mais sobre o que fazer ou como fazer. Mesmo assim as vezes me olho no espelho e não tenho uma única pista do meu caminho. Hoje quero sempre que possível faire d'business, mas fica difícil quando todos são adolescentes ou desempregados. Também não posso culpar o meu meio social, uma vez que se estou lá é porque também faço parte de algo ali, caso contrário nem mesmo estaria, mas as vezes não estou realmente, porque estou cuidando dos meus business pessoais. Desse ponto é um passo para ser chamado de egoísta. Queria poder contribuir mais com minha família e isso tem me aterrorizado emocionalmente, minha inépcia, meus primos (mais velhos ou mais novos) tem já seus negócios reais, casamento, dinheiro para viajar realmente e eu tenho o que? Um rosto bonito? Nem sou tudo isso, apesar de algumas pessoas tentarem me convencer de que sou algo que não sou, tento viver cada vez mais como mais um camponês sem nome, vivendo humildemente minha pequena existência em algum lugar distante, mas quando chego nesse lugar é ainda mais perto de casa, porque é como se minha casa sempre estivesse ali, por que não posso contribuir com eles? Eles que merecem contribuição, não esses espaços de interesseiros e farsantes. Mas chega a ser pior, as vezes sou eu que preciso de qualquer contribuição, qualquer ajuda financeira, para simplesmente poder viver como um pobre! Preciso de ajuda financeira para ser pobre em um país de terceiro mundo, e essa pra mim é uma grande piada porque ainda por cima me acusam de playboy, se soubessem como fico culpado todas as vezes que recebo qualquer favor ou dinheiro da minha família... Se soubessem como foi dificil ficar três meses sem poder trabalhar para levantar meu próprio dinheiro e voltar a dependência da família, como um inútil, ao invés de contribuir, dilapidando o pouco dinheiro dos meus pais porque o imbecil não tinha uma grana de reserva, por outro lado tenho que me felicitar por ter sobrevivido e administrado meus poucos recursos de forma muito eficiente, precisando realmente de uma ajuda, mas nada fora do comum, se serve como desculpa jamais exigi que me mantivessem de qualquer forma, sempre corri atrás e quem me conhece pessoalmente sabe que trabalho até dois horários ou quando for possível, mas ainda assim é suficiente para apenas "viver bem", eufemismo para a realidade do trabalhador honesto, vida independente, mas nao quero ser apenas independente, quero um dia poder ajuda-los de alguma forma, porque não aceito viver às custas de ninguém.