segunda-feira, 27 de fevereiro de 2017

Carnaval

Este é meu primeiro carnaval em Cuiabá. Originalmente sou de São Paulo, mas acredito que já passei o carnaval no Rio, além da proximidade familiar do carnaval da Bahia. Quando criança não me interessava muito pela idéia de marchinhas, mas também não entendia a vontade que o carnaval suscita. Para mim a festa era diária. Como criança não tinha noção alguma do sofrimento e das responsabilidades de um adulto. Na adolescência o carnaval aparecia como mais um espaço separado dos estudos ou trabalho, era uma espécie de território de encontros, era lá que eu deveria encontrar os conhecidos e talvez conhecer novas pessoas. Em São Paulo os bloquinhos se popularizaram e muitos seguem temas considerados ousados. Nunca fui ousado, e perto de pessoas que conheço sou um conservador. Hoje, apesar da aparência de 20 e poucos anos, tenho praticamente 30 e o carnaval para mim tem o brilho das marchinhas do passado, daquele samba de glamour, mas não me sinto motivado a sair na rua para qualquer coisa além de buscar comida pronta. Apesar de estar em um bom momento, meu corpo não é mais como era aos 20 e poucos. Tenho artrite, preciso usar óculos, não tenho como trocar o óculos velho que estou usando, e pra melhorar desenvolvi uma doença auto-imune na pele. Não comento com ninguém, apesar de algumas pessoas terem percebido. É motivo de grande sofrimento porque me impede de ficar natural, de ficar sem roupas por aí. Aparecem manchas no meu corpo, no começo vermelhas, depois um bom tempo brancas, e então desaparecem. Faz anos que vivo com esse problema, já busquei tratamento, mas nunca consegui me manter totalmente livre dessa condição. Às vezes acredito que é um castigo. Muitas vezes não sou religioso, mas nesse caso tenho minhas razões íntimas para crer que estou sendo punido e direcionado por alguma força maior. Aposto que se não fosse esse problema não teria um motivo a mais para evitar o sexo, mas um incentivo. Meu corpo não representaria impedimento para o instinto. Em alguns momentos meu corpo não é impedimento, uma vez que nem sempre estou em crise, mas ter um problema de pele me impede de ter relacionamentos longos e até acho que estar sozinho ajuda na melhora de minha aparência. Prefiro a solidão a abrir o jogo de minhas inseguranças. Na verdade não sei se estou preparado para qualquer relacionamento sincero assim, ao mesmo tempo não tenho vontade nenhuma de sair por aí, de me divertir no carnaval. Mal consigo me manter acordado, virar a noite para mim é agora quase uma ficção científica. Não tenho mais aquela urgência dos jovens. Moro em uma república em que tenho contato com três jovens da mesma faixa etária. Um deles é meu querido amigo (que talvez não seja mais meu amigo), o outro é estudante da sala dele e o terceiro é o namorado da irma mais velha do meu amigo. Como todos os rapazes na faixa dos vinte e poucos anos percebo que eles até desejam um relacionamento, mas são incapazes de mante-lo, e sentem essa urgência de sair de casa sexta a noite, algo que eu jamais vou entender, e não sei porque sentia esse tipo de desejo no passado. Sexta a noite representa hoje aquele dia em que você até pensa em sair, mas pode ficar em casa e se abster. Muito feliz por ter internet, por ter outras motivações que a diversão, ao mesmo tempo há o perigo do tédio, o perigo da crise existencial. De qualquer forma carnaval é para quem tem pique e o que sinto não é um fenomeno universal da experiencia humana. Muitos amigos, até mais velhos, devem estar curtindo. Como na música que pede para o sambista mais novo não deixar o samba morrer.

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